"As nuvens alaranjadas do poente iluminam tudo com o encanto da
nostalgia; mesmo a guilhotina." Kundera 1984
Sobre meus ombros - olhando o que faço, os olhos de todos. São
pessoas invisíveis que me veem por completo. Sobre meus ombros acho que sei o
que querem de mim, e tudo há para que eu o faça assim, como desejado. Falam coisas
sobre a beleza, abanam prêmios e facilidades, ameaçam com o medo da dívida e do
ridículo.
É difícil fazer o que eu sinto. Poder o que eu sinto. Porque
fizeram-me ser o que fizeram-me fazer ao longo de tantos anos. Seguir o cronograma,
observar o regulamento, planejar, poupar, escolher uma profissão, responder
corretamente, vigiar o amigo, punir o anormal, esquecer a minha infância.
Aprendi
a saber poder apenas o que me foi permitido e incentivado.
O ateliê é um campo onde há linhas de fuga, frestas. Um campo onde se deve
caminhar sobre a improvável decisão entre o peso e a leveza do Ser (como disse
Kundera). O peso das expectativas do outro, de todo o emaranhado de relações de
poder que me atravessam, da concretude do mundo real ou a leveza absolutamente livre e de tal forma
desligada deste mundo, que fica mais leve que o ar, evaporando-se com as
nuvens.
O artista fazendo busca por uma outra experiência de ser. Busca
uma experiência que escape dos campos demarcados, já percorridos. É agente de
transformação e expressão e sabe que se encontra dentro das malhas de poder; deseja modificá-las para seu fluir, mas só pode almejar êxito caso pare de
tentar.
...alguma coisa pode acontecer. Essa certeza nos coloca acessíveis às experiências potenciais de aprendizagens imanentes!
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