segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Explicação da explicação da explicação da explicação...

A partir do texto "Infância do ensinar e do aprender" pude lançar outro olhar sobre Sócrates, através do olhar de Ranciére. Refleti sobre como a desigualdade ou a igualdade das inteligências como pressupostos no ato de ensinar criam toda uma circunstância de embrutecimento ou de emancipação das inteligências. Sócrates via o aprendente como alguém que não sabe o que ele - o mestre - sabe, e assim põe-se em uma posição de superioridade. Entretanto, também amplia o campo de reflexão ao trazer a tona a necessidade do cuidado de si e o vislumbre da ignorância de cada um.
Jacotot, por sua vez, não sabe o que vai ensinar e assim, põe-se em condição de igual.
"A emancipação é o contrário do embrutecimento: uma inteligência se emancipa quando só obedece a si mesma." Esta ideia ecoou em mim ao observar meu próprio trabalho como professor e como artista, pois percebi as aproximações e distanciamentos entre os sentimentos que cultivo e busco num e noutro campo de ação: a arte e a docência.

No campo da arte, obedecer a si mesmo é tão difícil quanto promover este estado à pessoa a quem devo ensinar algo, como professor. Se no trabalho no ateliê - mesmo estando sozinho comigo mesmo - sou atravessado por forças que vigiam o que faço - forças internas provenientes da minha formação, do julgamento social cristalizado em mim; na sala de aula, o 'aprendente' também é transpassado por essas forças e mais uma: eu, professor.

Como agir o poder de professor para a emancipação das inteligências e não para o seu embrutecimento? Como evitar embrutecer-me a mim mesmo?

A resposta - que segue importante mesmo que parcial, genérica e aberta - parece estar na "partilha de vida" (Mantoan) por meio da expressão e na retomar da infância nos espaços e tempos de aprendizagem e ensino.

Ao partilharmos vida, nos livramos das explicações, pois tudo acontece organicamente, intuitivamente, em um processo nômade de pensamento (Deleuze) e ação. Ao partilharmos o tempo presente sem pretender dominar, controlar e normalizar estaremos no caminho da emancipação intelectual. É o que nos suscita Kohan e suas referências. Jacotot - o mestre ignorante de Ranciére -apenas verificava se o trabalho estava sendo realizado com atenção e isto nos leva a outras questões: o que é a atenção nos dias hiperconectados e interrompidos de hoje? Como recuperar este poder de concentração erodido pelo excesso de opinião, pelo excesso de informação, pelo excesso de trabalho?

"A lógica da explicação ajuda e potencializa a desigualdade", posto que pressupõe um sujeito que não sabe que precisa ser ajudado a saber. Este pressuposto cria uma hierarquia, uma desigualdade radical que por sua vez cria uma "incomunicação absoluta: falar com alguém que, por ser inferior, não pode entendê-los".

"É possível ensinar sem explicar, o que se ignora." Jacotot sempre perguntava: O que vês? O que pensas disso? O que fazes com isso? Como esta tríade germinal de perguntas se desenvolve nos solos e mentes contemporâneos, quando tanto o ver, quanto o pensar e o fazer são ditados pela velocidade, pela superficialidade e pelo imediatismo institucionalizado pela escola, pela tecnologia, pela cultura e pela cidadania?




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